Não perca o fio

Nem todas são mulheres de Atenas, nem todas tecem longos bordados, mil quarentenas. Mas fios, tramas, novelos, linhas e cores têm muito a ver com a vibração feminina instintiva.
Ainda hoje, no fervo das cidades grandes, mulheres colocam muita energia em cada ponto, irradiam em suas mandalas o guardado, o esquecido, o negado, mulheres em grupo sorriem, trocam, se revelam.
Tricô, crochê, bordado, a magia dos fios rende muitas histórias. Absoluta traz algumas.



Simpatia no blusão
Numa tarde bacana, na graminha do lago da faculdade, jogando conversa fora entre um turno e outro de aula, uma amiga contou que, quando começou a namorar o atual marido, tricotou um blusão pra ele... Alguém tinha lhe ensinado uma "simpatia", onde deveria, a cada ponto feito, repetir algo que não lembro se era o nome dele, ou um mantra do tipo "amo o fulano", ou "quero casar com fulano". Ela atribui a isto o fato de ter conquistado o amor dele e terem se casado.
Não sei se é assim mas, de fato, colocamos uma energia toda especial ao se tecer um trabalho. Comecei a tricotar aos oito anos de idade, quando, após algumas tentativas frustradas, as mãos conseguiram finalmente segurar e manipular as agulhas e a lã.
Já teci muitas peças, para amigos, namorados, cachorros, gente desconhecida. Em cada uma coloquei meu carinho por aquele ser. De vez em quando alguém me diz: "sabe aquele blusão que tu fez pra mim em mil novecentos e lá vai? Ainda tenho, tá novinho!"...
Imagino o que deve ser para uma futura mamãe tricotar as roupinhas do bebê que vai chegar. Assim como a energia dos amores não sai dos lugares por onde passaram, a energia do afeto por aquela pessoa que vai usar a roupa fica impregnada em cada ponto, e é uma bênção descobrir que, muitos anos depois, mesmo não estando mais novinhas, as roupas fazem essas pessoas lembrarem de nós com o mesmo carinho dispendido ao tecê-las.
Se a simpatia da minha amiga funciona, não sei. Mas estão casados até hoje, há uns dez, quinze anos... E, assim, vejo o quanto vale a pena colocar carinho e afeto em tudo o que se faz, porque ficam para sempre.

Jô Merheb
Nutricionista, tricoteira nas horas vagas.
jomerheb@yahoo.com.br
Esteio/RS




Círculos reveladores

Certa vez, decidi estar num círculo de vinte mulheres, até então desconhecidas ou pouco conhecidas reciprocamente; jovens mulheres de todas as idades e diversidades cotidiana, abrindo espaço para uma convivência intensa durante vários dias. A idéia inicial era para o encontro com a dimensão feminina da criação espontânea do fazer, bordando em cores fragmentos existenciais.
Cada momento tornou-se pleno em sentido e encantamento para mim, num caleidoscópio de momentos vividos, sonhos, utopias, reflexões...
O rabiscar inicial, a composição de cada cesta repleta de pequenos novelos coloridos, iam introduzindo minhas e todas as mãos femininas nessa jornada, permeada de arquétipos, afetos, histórias, canções, revelações, poemas, descobertas, instantes de silêncio introspectivo...
Às vezes refazendo alguma parte do bordado, entrei em contato com a flexibilidade e com a rigidez em meu ser. Outras vezes, observando o avesso desse meu bordado, intencionalmente desorganizado, permiti-me reconhecer com naturalidade, aspectos “não apresentáveis” de mim mesma, como a outra face de quem sou.
À medida que os nossos bordados iam ganhando formas e cores, mais eu me percebia revelada em cada um deles. Nas ajudas recíprocas, quando um ponto diferente desafiava nossas habilidades, exercitei em alternância o “dar e receber”, movimento mais primitivo da vida, e vislumbrei o fortalecimento de vínculos entre nós.
A partir dessas vivências, tenho colocado mais atenção aos fios, tramas, novelos, linhas e cores na minha vida. Às vezes perco o fio, me desalinho... Outras vezes desato nós, puxo mais longo o fio da vida...
Bordando no pano, transbordo no instante!

Maria Lucineide Nobre
Aprendente na arte de viver e ser
lucineidenobre@yahoo.com.br
Fortaleza/CE




Mandalas de poder

Sempre achei a energia que emana dessas peças de crochê muito especial... Uma energia nutridora, aconchegante. Acho que as avós de antigamente, como anciãs sábias, ancoravam melhor as forças instintivas e a sabedoria do feminino profundo. Essas mandalas irradiam o guardado, o esquecido, o negado, o rejeitado, a força, a beleza e o poder do feminino, nossos maiores tesouros e todo o desconhecido. Super aquariano!!!

Eliane E. Binz
Psicóloga e Terapeuta Floral.
elianebinz@hotmail.com
Porto Alegre/RS

2 comentários:

  1. Que cantinho feliz de qualificação de teceturas simples mas de tamanho impacto! Tricotei muito e desejo que meu amor seja levado nos tecidos que teci há anos. Costurei embalada por avó e tia que dadivosamente distribuiram seu saber e carinho e ofereceram a dádiva de costurar vínculos. Amo as mandalas, de dentro pra fora, de fora pra dentro. Cada contato é um bálsamo de informações do incosnciente que refazem o centro, trazem a calmaria e o foco! Já utilizei em grupos e o aprendizado é imenso... ali vi que o poder é além do previsível pois vem de forma sagrada!
    Bom encontrar testemunhos de semelhante profundidade, traz o empurrãozinho de seguir serzindo!!!

    Rute Rodrigues
    Psicóloga - Arteterapeuta - Terapeuta de Família
    Porto Alegre - RS – Brasil
    51- 91449504
    rutepoa@terra.com.br
    www.coisasderute.blogspot.com
    www.projetoninhors.blogspot.com

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  2. Adorei estar aqui...
    Veja nosso blog. Seja bem vinda a ele.
    karim

    http://roda-de-mulheres.blogspot.com/

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