Tá pronta para um "cara-a-cara" com o amor real?

Estaremos prontas para sairmos do ideal e irmos ao "cara a cara" com o real? Estaremos disponíveis para a conexão mais profunda com o que somos, e não com o ideal de mocinha ou mulher fatal? Haverá espaço para viver minha afetividade e minha sexualidade ouvindo meu referencial interno? Como saber se aposto ou não? Como saber se minha insatisfação é fruto de uma idealização que espera o outro perfeito ou não?
Essas e outras questões fervilham nos corações das mulheres de hoje, e para elas a psicóloga Juliana Gomes Garcia traz algumas chaves importantes para que a busca pelo amor não vire uma caça onde a caçadora nem saiba onde está atirando, se apaixonando pelo ato da busca em si.
E Juliana alerta:
“É essencial reconhecer: não vale qualquer coisa, porque não somos qualquer coisa”.


Chego em casa com vontade de escrever, ligo o computador e logo me perco conferindo e-mails, sufocando meu movimento inicial, perco a referência interna. Quantas vezes nos vemos assim? Um ímpeto inicial e natural nos lança para a busca e acabamos nos perdendo no caminho, distraídas com mensagens na caixa de e-mails, controle remoto, promessas miraculosas, seja lá o que for. No ímpeto ligado às relações amorosas também pode ocorrer algo parecido.
Vincular-se é uma exigência da estrutura humana, não é só uma questão pessoal. Mas culturalmente foram construídos muitos mitos em torno da questão à qual nem sempre nos auxiliam compreender. Entre encontros e desencontros – mais desencontros, é verdade – muitas mulheres se perguntam como viver um amor de verdade. Algumas dizem: "amor daqueles de cinema". Mas esse é o amor de verdade?
Amor de cinema é beijo no ângulo perfeito, sinos tocando, mulher maquiada ao acordar, homem sempre com um lindo sorriso branco, aliás, amor de cinema também nunca é homossexual, ou ao menos este não é reconhecido como ideal. Não sobra espaço para diversidade, afinal o que interessa é padrão, modelo. É tanta idealização que ficamos “destreinadas” para o real.
Estaremos prontas para sairmos do ideal e irmos ao "cara a cara" com o real? Estaremos disponíveis para a conexão mais profunda com o que somos, e não com o ideal de mocinha ou mulher fatal? Haverá espaço para viver minha afetividade e minha sexualidade ouvindo meu referencial interno?
O contato consigo mesma é essencial para se partir para qualquer encontro. É preciso se conhecer e se reconhecer para ser inteira. Para não sair procurando por aí o engodo da "cara metade". Se não, a busca pelo amor vira uma caça e viramos a caçadora que nem sabe para onde está atirando, muitas vezes se apaixonando pelo ato da busca em si, perdendo de vista o que se deseja nesse caminho.

Não somos qualquer coisa - É essencial reconhecer: não vale qualquer coisa, porque não somos qualquer coisa. Temos a exigência de encontro real, de duas pessoas reais, que possam se sentir plenas nesse encontro, mas que não são metade fora dele. Amor que respeita a individualidade do outro, sem transformar isso em individualismo, que se propõe a estar junto reconhecendo o espaço de cada um. Amor que só é possível se nos dispomos à inteireza dentro e fora da relação.

Se não estamos inteiras, enviamos ao universo uma mensagem de incapacidade que acaba se fortalecendo no cotidiano, são as profecias auto-realizáveis. E acredite: nos tornamos incapazes mesmo, atraímos companhias que não nos permitem crescer, vivemos relações desprazerosas, não conseguimos enxergar a beleza do outro nem ir em busca do que seja realmente belo em profundidade, por ainda não estarmos conectadas com nossas mais altas possibilidades e nossa mais ampla beleza. O que também é diferente de criar máscaras de auto-afirmação. Não precisamos nos mascarar quando entramos em contato com o que já há de belo em nós.

É preciso conhecer o que carregamos em nós para reconhecer no mundo aquilo que nos corresponde ou não. Caso contrário, vamos só acumulando desencontros, mágoas, medos, tentando levar a diante um jogo que diminui nossas possibilidades e as possibilidades do outro. Com uma mudança de referencial, podemos enxergar a relação amorosa de outra maneira: seja para reconhecer que aquela proposta relacional não nos corresponde, seja para perceber haver ali uma realidade mais preenchida de amor verdadeiro do que nossas idealizações.
Às vezes já se está vivendo uma relação, mas não se sabe se é por ali que a coisa deve caminhar. Como saber se aposto ou não? Como saber se minha insatisfação é fruto de uma idealização que espera o outro perfeito ou se, de fato, não há correspondência fundamental naquela relação? É preciso ouvir pacientemente o chamado interno, se lançar na realidade, vencer o medo desse mergulho, pois, por mais belas que sejam as máscaras e mais perfeitos sejam os sonhos, eles não têm o sabor real da fruta na boca.
Temos a exigência de viver em totalidade nossas experiências, nosso íntimo pede por intimidade com o outro. Mas para isso, mulher, assuma e cuide desse sagrado espaço para só então convidar alguém para comungar dele com você. Intimidade com respeito, intimidade que nos faz crescer, que nos permite amar pelo que somos e pelo que o outro é, que não é perfeição e nem nos faz metade.
Viver tal encontro não é ponto de chegada: é preciso renovar dia a dia o contato consigo, não se perder de vista, cuidar de seu espaço sagrado e do espaço de intimidade criado na relação. Encontrar-se não é simples meio para encontrar o outro, mas é finalidade em si, que tem conseqüências benéficas. Estejamos atentas ao mundo interno para não deixarmos de lado o amor real por nós mesmas.


Juliana Gomes Garcia
Psicóloga, Pós-graduanda em Psicodrama, Artesã, Facilitadora em trabalhos grupais com mulheres, Sócia-fundadora do "Espaço Revitalizar - Psicologia, Educação e Artes"
http://julianaggarcia.blogspot.com
julianaggpsi@gmail.com
BELO HORIZONTE/MG

Fotos: www.sxc.hu

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