Quem nos faz esse delicioso chamado é a psicóloga Juliana Gomes Garcia.
"Um encontro de dois: olhos nos olhos, face a face. E quando estiveres perto, arrancar-te-ei os olhos e colocá-los-ei no lugar dos meus; E arrancarei meus olhos para colocá-los no lugar dos teus; Então ver-te-ei com os teus olhos E tu ver-me-ás com os meus" (Poema "Divisa", de J. L. Moreno, criador do Psicodrama)
Com essa forte imagem, Moreno apresenta em sua teoria psicodramática a idéia de Encontro. Para ele, essa vivência poderia se dar em qualquer relação, entre irmãos, namorados, amigos, terapeuta-cliente, sendo o mais importante esse caráter de percepção em mão-dupla e seu efeito transformador. É mais do que olhar para o outro: é poder ver através de seus olhos. Ninguém sai o mesmo depois de um Real Encontro, depois desse contato face a face em que vemos e sentimos a nós mesmos e ao outro de uma maneira incrivelmente nova e reveladora. Um momento vivido no aqui e agora, que toca algo que está para além do que podemos racionalizar e alcança nossa totalidade. Forma-se a partir de então um "nós", mas não um "nós" que engole o "eu" e, sim, que se enriquece a partir da inteireza de cada um e da forma única gerada a partir do vínculo. É algo que revigora, amplia, nos faz entrar em contato com algo maior e belo.
É fácil transpor essa reflexão para o âmbito da relação amorosa, não lhe parece?
Quando vivemos esse tipo de Encontro é aquele momento do famoso "bater de sinos", naquele instante breve em que vejo a beleza do outro e sinto, além disso, a minha própria beleza humana em contato com esse outro. O que vejo refletido em seus olhos é a experiência de ser mais eu mesma e não de me anular. É esse tipo de Encontro que nos faz ampliar nossas perspectivas, que faz bem à alma, à pele, ao coração! Quem não conhece uma mulher que depois de ter encontrado aquele alguém passa a ser mais vista, mais notada por sua beleza estar mais radiante? Quem não conhece a velha história de que ver o "passarinho verde" transforma nosso dia? A beleza desse Encontro passa a se refletir no modo como nos vemos, como vemos o mundo e como o mundo nos vê.
Não tem fórmula para acontecer, simplesmente acontece. Talvez se possa até pensar em como manter a chama desses momentos acesa, mas gerar a faísca artificialmente não dá. É preciso também ter a consciência que momentos de Encontro são momentos únicos, localizados no tempo e no espaço. Precisamos saber que não vivemos o tempo todo nessa experiência de êxtase, mas que sua vivência renova algo dentro de nós e nos abastece para continuar a caminhar.
Não se trata da idéia de "cara metade" em que imaginamos que um fica manco na falta do outro. Na verdade, trata-se de perceber que, no contato com essa outra alma, ocorre algo que desperta o belo que está em mim e que minha presença também pode despertar isso nela. Somos mais quando juntos, podemos acessar outros ângulos, outras potencialidades, outras delícias, outros horizontes a alcançar, outros pontos cegos que precisam ser cuidados, outras amarras que estavam escondidas. Às vezes dá trabalho! Mas, a partir disso, podemos mais crescer, mais construir, mais vicejar.
É preciso estar aberta e acreditar que se pode encontrar esse algo mais dentro de si. Caso contrário negamos a possibilidade de aceitar os "olhos nos olhos". Devemos, sim, nos abrir mas para encontros que nos permitam crescer e que sejam também oportunidade de ampliação para o outro, caso contrário caímos em armadilhas. Afinal, o que merecemos mesmo é amor de verdade, amor que traz vida para quem o experimenta. Mas deixar de caminhar por medo das armadilhas não nos fará mulheres mais fortes.
Precisamos é exercitar nosso faro, nossa percepção de nós mesmas e do mundo para daí vencer o medo de experimentar isso que nos ultrapassa, para sentir que continuamos inteiras e melhores a partir de experiências assim. Essa é a mágica do amor, a mágica de chegar perto e poder viver algo intenso e sereno ao mesmo tempo. Esse algo que desperta em nós o humano e o divino, que nos faz sentir mais profundamente a mulher que somos. Esse algo que espera de nós o despertar da coragem de acreditar que é possível viver e sentir a beleza da vida que aí está, aqui e agora. Coragem de olhar nos olhos e Encontrar de verdade o outro e a si mesma.
Por fim, lembro a simples e instigante questão de Carlos Drummond de Andrade:
"Que pode uma criatura senão, entre outras criaturas, amar?"
Sigamos nossos instintos, nossos sentimentos mais profundos e cuidemos para que nossa experiência amorosa seja sempre de um Encontro Real, nos possibilitando mais ser e mais amar.
Juliana Gomes Garcia
Psicóloga, Pós-graduanda em Psicodrama, Artesã, Facilitadora em trabalhos grupais com mulheres, Sócia-fundadora do "Espaço Revitalizar - Psicologia, Educação e Artes"
http://julianaggarcia.blogspot.com
julianaggpsi@gmail.com
BELO HORIZONTE/MG
Foto: www.sxc.hu
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